segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

pombos no buraco do ar-condicionado


sua cabeça triplicou de tamanho. não gosta de beber à tarde, mas a presença do amigo carioca pedia um brinde no almoço. chegou em casa suando do sol forte. sentia latejar a cabeça quente e ouvia o barulho dos pombos cinzas que fizeram ninho no buraco do ar condicionado. foi até o banheiro, encheu a toalha de água e a enrolou na cabeça, como um turbante isolante do mundo. deitou. a cabeça girou molhada, desatarraxando o pescoço aos poucos. fez força pra dormir, mas lembrou. o bilhete colado na porta pedindo pra avisar a mãe em cachoeirinha, a porta daquele vidro que distorce as imagens entreaberta e os braços em Z tortos no chão. fez o que podia ser feito, repetia, o que podia ser feito, feito, fei. os pombos faziam o barulho que os pombos fazem, mas agora os sons se misturavam, abafados, um rrrrr entrando no outro, fazendo uma cama. da janela vinha um vento lateral e a cabeça diminuía a cada respiro. os pombos se calaram e o mundo é uma bolha de ar, um carro passou e todo mundo vai morrer, devagar, existe uma quantidade enorme de pessoas bonitas no mundo, calma, pequeno, sereno, respira, dormiu e os pombos levantaram vôo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário