sexta-feira, 30 de abril de 2010

Dos dias o fim

Vejo, com a testa na janela, um rosto
Vejo a teimosia de um velho
Que se agarra a ouro gasto.
Segura o tempo para ele aprender a não correr
Segura o tempo para ele aprender a se arrastar

Diz: “ Demora, por favor, para eu poder me lembrar
Dá-me os ponteiros, por favor, para eu poder me entender.”

Seu meu plano de vida
É estagnar
Roubar-lhe os ponteiros para levar
E viver dos dias o fim como hoje.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Conselho de um velho

Deve

Roubar-te uns anos
pra viver mais hoje
o teu dia não acaba
Foi só a noite
Mais fácil que pensar em cair
Mais fácil que crer e prever
É dobrar esquinas
E guardá-las no bolso.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Assim, mudo o mundo

Esqueço minhas chaves de propósito.Qual o seu ?Doze? Assim eu consigo driblar o destino. Os minutos que eu gasto voltando pra casa e pegando as chaves mudam as horas que eu vou estar nos lugares e o meu futuro , assim, não é o mais óbvio, o planejado. Por exemplo: Se eu tivesse me lembrado das chaves quando sai de casa, não me atrasaria, não a veria entrando neste prédio e a porta que eu segurei pra você se fecharia. Provavelmente não falaria com você nunca na minha vida. Chegou o décimo andar, boa tarde.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

O poema que nunca li

Aquele poema marcou em minha memória um sentimento de êxtase. Estava sentado na sala de estar, meus pais jantando, quando uma mulher recitou um poema de Carlos na televisão. Foram entranhando-se em meus ouvidos as mais significativas palavras que ouvira, pois me trouxeram uma felicidade ímpar. Talvez devido à semelhança entre os conflitos do escritor e os meus. A súbita comoção transbordou-me a razão, e inconscientemente, me esqueci dos versos.
Esqueci-me, também, do tema do poema. Só possuía a lembrança do sentimento ao ouvi-lo.
Saí de casa correndo em busca de minhas palavras. Tomei o ônibus, e os cinco minutos do trajeto pareceram horas. Cheguei à livraria e comprei todos os livros de Drummond que encontrei. Devorei as páginas violentamente. Em vão.
Não encontrei meu tão desejado poema, e desculpe-me, leitor, mas não o encontrei até hoje. Anseio pelo poema, ou pelo menos por seu esquecimento, para livrar-me a angústia. Porém ele se pensa por si, na cabeça impotente de uma mente capaz.
Em alguns dias, penso que talvez o poema não exista. Talvez a televisão estivesse desligada naquele tarde. Esse pode ter sido um plano de minha própria alma sobre meu corpo. Como uma forma de sempre promover um desejo de procura. Uma ânsia de viver em função de encontrar algo.
Penso, em outros dias, que o poema não é de Drummond, mas meu. E a minha sede de ler, é transformada em vontade de escrever, (re)produzir e ordenar as tais palavras na ordem sublime que ouvira em meu devaneio.

Esforço para ver tua alma em vão

Inexplorável alma é a alheia
Dividi-se em quinhões e aos milhões
A cadeira parece estar vazia
Uma vez invisíveis uns aos outros

No esforço gritante que no fim
Não revela do filme nem a cor
Não revela do campo nem a flor
Minha vida, sinuosa, esvai-se.

Por fim desfaço o véu da nova moça
As paredes são tontas, estreitaram-se.
E o sufoco embaça-me os olhos.

Desgostoso, não vejo nada além.
Da superfície lisa, encobridora
Desse mar, que no fundo é revoltoso